...21... filosofando... part twenty-one...

Com  as  boas  influências  vindas  da  filosofia  gandhiana...
que  havia  aprendido  com   o  richard...
(...  mencionado  no  "part-19"...)...

... adicionadas  aos  novos-horizontes...
que  lentamente  iam  se  revelando...
graças  ao  professor-de-piano......

... eu  sentia  que  as  condições  eram  favoráveis...
que  as  coisas  estavam  acontecendo...
meio  sem  grandes  planejamentos...

que  a  vida  estava  me  conduzindo...
numa  direção  onde...
eu...  nem  sempre  tinha...  o  controle  do  leme...

mas  que...  por  sorte...
os  ventos  estavam  me  levando...
para  lugares  bons...
para  lugares...  saudáveis...

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ao  visitar  cada  apartamento  dos  inúmeros  alunos-particulares...
que  me  chamavam  para  ajudá-los  em  matemática...
... percebia  a  diversidade  de  universos  existentes...
em  cada  um  daqueles  espaços...

mas...  nada  disso  era  importante...

o  fundamental  naquelas  visitas...
era  a  interação  que  eu  tinha...  com  cada  aluno...
tão  diferentes  um  dos  outros...
cada  um  com  sua  particularidade...
com  sua  personalidade...

e...  todos  me  recebiam  bem...
normalmente  a  mãe...  me  oferecia  um  copo  d'água...

a  aula  acontecia  usando  folhas-de-rascunho...
cada  um  com  sua  deficiência...
cada  aluno  com  sua  beleza-intrinsica...
a  beleza  de  ser...  um  ser-humano...
um  ser...  querendo  aprender...
querendo  se  desenvolver...
pedindo  ajuda  a  um  outro...  ser-humano...

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profissão  belíssima...
a  de  um  professor-particular...

o  professor-de-piano  tinha  razão...

a  decisão  de  trabalhar  dando  aulas...
foi...  realmente...  bem  melhor  do  que...
ter  me  lançado  ao  primeiro  chamado  do  caderno-de-classificados...
ou  seja... me  candidatar  à  vaga  de...  vendedor-de-livros...

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...  para  que  as  aulas  pudessem  acontecer...
era  necessário  uma  certa  preparação  preliminar...
em  termos  de  uma  certa  infra-estrutura  de  "marketing"...

"marketing"  seria  provavelmente...
uma  palavra  um  tanto  sofisticada...
para  traduzir  algo  bem  mais  simples...

o  que  era  feito  era  simplesmente  uma  divulgação  bem  artesanal...
que  consistia  na  colocação  de  um  super-mini-cartaz...
dando  meu  nome  e  telefone...

o  anúncio  era  colocado  nos  quadros-de-avisos  das  escolas...
ou  então  nos  cadernos-de-telefones-úteis...
lá...  da  secretaria  da  escola...

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tudo  isso  era  feito...
percorrendo  meia-dúzia  de  escolas  da  área...

o  colégio  anglo-americano...  na  praia de botafogo...
fazia  parte  desse  itinerário  de  "marketing"...

ao  chegar  lá...
me  pediram  para  falar  com  um  dos   diretores...

ele  me  perguntou:

         " você  tem  experiência  em  dar  aulas...?..."...

expliquei  que  sim...
já  estava  dando  aulas  já...  há  algum  tempo...
...  que  tinha  tirado  primeiro-lugar  no  vestibular...

ele  me  pergunta:

         " você  tem  provas  disso  que  você  está  dizendo...?..."...

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abro  aquele  tipo  de  pastinha-de-cartolina-retangular-cor-de-rosa...
com  aqueles  dois  elastiquinhos-pretos  nas  duas  pontas...

...  retiro  o  caderno  do  jornal-dos-sports...
cuja  última-página  exibia  a  propaganda  do  curso-vetor...
divulgando  o  nome  dos  alunos  que  obtiveram...
o  primeiro-lugar...  o  segundo-lugar...  etc...
nas  diversas  faculdades...  

e...  ao  deslocar  o  jornal  do  meu  colo... para  sua  escrivaninha...
percebo  que  ele  nem  se  dá  ao  trabalho  de  verificar...
se  meu  nome  estava  lá...  ou  não...

vai  logo  decidindo:

         " vou  lhe  dar  as  turmas  de  dependência "...
( hoje...  seriam  as  turmas  de  recuperação )...

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ele  me  passou  o  horário  das  aulas...
falou  que  poderia  começar  na  segunda  feira...

falou  também...  para  eu  tirar  a  carteira-de-trabalho...
e  que  a  entregasse  ao  departamento-pessoal...

nos  despedimos...

e...  em  casa...  comecei  a  preparar  as  aulas...
para  tamanha  tarefa...
um  tarefa  de  extrema  responsabilidade...
ou  seja...  dar  aulas  num  colégio...
numa  turma...

... mesmo  sabendo  que  era  apenas...
    ... uma  mini-turma  de  dependência...

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em  casa...  ao  fazer  o  planejamento-das-aulas...
eu  tinha  como  referencial...
o  nível-de-estudo  que  estava  acostumado  a  lidar...
no  curso-vetor...

baseando-me  neste  referencial...
caprichei  nos  rascunhos  que  seriam  a  preparação-das-aulas...

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segunda-feira...
chego  cedo  no  meu  novo  trabalho...

pergunto  onde  é  a  sala-da-dependência...

a  secretária  me  leva  lá...

espero  o  relógio  marcar  o  início  do  primeiro-tempo...
naquela  manhã...

espero  mais  um  pouco...

ninguém  aparece...

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depois...  me  explicam  que  é  assim  mesmo...
as  turmas  de  dependência  têm  poucos  alunos...

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no  segundo-tempo  aparecem  uns  dois  alunos...

dou  aquela  aula-caprichada...

tranquilo...
não  foi  tão  mal  assim...

penso  comigo  mesmo...  ( já  no  ônibus  de  volta...)

"  até  que  não  foi  tão  difícil  assim...
   nem  era  preciso  me  preocupar  tanto...  em  preparar  as  aulas...
   pois...  o  nível  é  bem  tranquilo...  bem  básico..."

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mas...  nem  por  isso...  deixava  de  caprichar  nas  aulas...

tinha  muito  o  que  falar...
muito  o  que  explicar...

havia  todo  um  mundo  de  teoremas  interessantes...
para  apresentar  aos  alunos...

demonstrações  sobre  os  teoremas  de  trigonometria...
...  da  geometria-analítica...

eu  gostava  das  demonstrações...
porque...  elas  apresentavam  uma  linha-de-raciocínio...
que  conduziam  à  tese-principal...

e...  com  isso...  a  vantagem  era  dupla...

primeiro...  porque  o  aluno  não  precisava  decorar  a  fórmula...
( que  era  a  tese  da  demonstração )...

segundo...  porque...  ao  observar  a  demonstração...
tínhamos  a  oportunidade  de  sentir...  em  detalhes...
o  mecanismo  da  argumentação  matemática...
que  no  fundo...  era  uma  sequencia  lógica  de  passos...
e...  com  isso....  estaríamos  exercitando  a  capacidade  de  pensar...

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empolgado  com  a  filosofia-das-demonstrações...
acabava  deixando  os  poucos  alunos  das  turmas-de-dependência...
um  pouco  perplexos...  um  pouco  curiosos...
em  ver  um  professor  tão  diferente...

... com  um  cabelo  longo...
encaracolado...
com  chumaços  volumosos...
descansando  sobre  os  ombros...

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afinal...  era  o  ano  de  1972...

o  cabelo  enorme...  nos  ombros...
já  era  algo  conhecido...

não  era  uma  novidade  tão  grande  assim...
era  um  estilo  que  muitos  de  nós  já  havíamos  adotado...

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ainda  era  algo  exótico...
mas...  nem  tanto...

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e...  ao  ver  um  professor  com  18  anos-de-idade...
com  o  cabelo  nos  ombros...
empolgado  com  as  demonstraçõeszinhas  dos  teoreminhas  da  trigonometria...
e  da  geometria-analítica...

...  tudo  parecia  uma  espécie   de  "folclore"  interessante  e  bem-vindo...
ao  colégio  anglo-americano...

...  que...  sem  dores-de-consciência...
acolhia  os  alunos  que  não  conseguiam  passar  no  andrews...
a  poucos  metros  de  distância...
no  quarteirão  vizinho...

em  resumo...

o  andrews  era  o  colégio  dos  estudiosos...
    ...  filhos  da  alta-society...

... o  anglo-americano...  era  o  colégio  da  vagabundagem...
        ( que  também  pertencia  ...  à  mesma  "society"...)

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a  diferença  é  que  os  primeiros...
tiveram  a  sorte  de  ter  uma...  certa  base-acadêmica...

...  enquanto  que  os  segundos...
por  um  motivo...  ou  outro...
não  tiveram  a  mesma  sorte...

eu  apenas...  observava  o  fenômeno...
sem  nenhum  julgamento...

tentava  ensinar  no  anglo...
como  se  estivesse  numa  escola  qualquer...

para  mim...  não  existia  diferença...
em  termos  de  consideração  para  com  o  aluno...

o  desenvolvimento  individual...
o  progresso  em  relação  a  si  mesmo...
era  o  que  interessava...

mas...  o  contraste  entre  as  duas  escolas  era  visível...
embora  ambas...  lidassem  com  o  mesmo  tipo-de-classe-social...

paro  por  aqui...
mandando  meu  abraço  para  os  dois...

para  a  turma  dos  estudiosos...
e...  para  a  turma  da  vagabundagem...

pois  ambos  visavam...
um  objetivo  comum:
                                ...  a  felicidade...

um  grande  abraço...
                                ...luis antonio...